O que vem à sua mente quando descobre que Ronnie Coleman, um dos maiores ícones do fisiculturismo, já passou por dezenas de cirurgias na coluna, no pescoço e no quadril e há anos trava uma verdadeira batalha para conseguir andar sem ajuda de muletas ou cadeiras de rodas por conta do treino?
Pois é, a história do atleta multicampeão causa admiração em muitos fãs, mas também espanta pelo histórico de lesões e a condição física debilitada que Coleman tem hoje, graças ao treinamento pesado que seguiu por anos, muitas vezes indo além do limite da dor —como pode ser visto no documentário “The King”, na Netflix”.
O fato é que, quando falamos de atividade física, não podemos comparar pessoas que praticam exercícios por saúde e lazer com atletas, que em qualquer esporte precisam exigir o máximo do corpo para obter resultados. De qualquer forma, a história de Coleman serve de exemplo para mostrar que nada em excesso faz bem e é importante conhecer e respeitar seus limites para evitar lesões ou outros problemas de saúde.
“Um atleta profissional possui um relativo curto período para desempenhar sua atividade esportiva e obter ganho financeiro e pessoal, o que o leva muitas vezes a priorizar a performance em vez da saúde. No entanto, para um não profissional, mesmo que o treinamento vise o alto desempenho, a melhor estratégia é sempre focar no bem-estar e na longevidade”, diz Bruno Takasaki Lee, médico ortopedista pela Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo) e especialista em cirurgia do pé e tornozelo.
“A sobrecarga excessiva provocada pelo treinamento, como acontece muito no esporte de alto rendimento, não faz bem para o corpo e gera desgaste articular e físico, provocando lesões”, completa Leandro Shimba, médico do esporte e ortopedista pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Como evitar o treino excessivo
Não é simples determinar em que ponto uma atividade física passa a ser excessiva e prejudicial à saúde, já que a quantidade de carga, o volume e a intensidade de treino que cada pessoa suporta é algo muito individual e depende de fatores como genética, histórico de treinamento, alimentação e descanso. De qualquer forma, algumas regras valem para a grande maioria.
“Dizemos que um treino é excessivo quando a pessoa treina sempre em alta intensidade e não respeita o tempo de recuperação necessário entre uma atividade e outra, ou quando passa muito mais tempo praticando exercício do que realmente precisa para ter resultados, fazendo um volume de treino exacerbado”, explica Guilherme Boccalini, profissional de educação física pela FMU, especialista em atividade física para prevenção, tratamento de doenças e promoção de saúde e personal trainer na academia Bodytech.
De acordo com o American College of Sports Medicine (ACSM), o tempo necessário de descanso entre um treino e outro varia entre 48 e 72 horas, conforme o volume e a intensidade do exercício. Esse intervalo de recuperação é para um mesmo grupo muscular. Ou seja, se você malhar pernas hoje, o ideal é aguardar dois dias para voltar a trabalhar a região, mas pode fazer amanhã exercícios para peito, costas e braços, por exemplo. Já para quem pratica modalidades como corrida, ciclismo e natação, é possível treinar em dias seguidos, desde que se alterne atividades leves e intensas.
“Alguns trabalhos científicos já mostram que é possível treinar um mesmo músculo todos os dias. No entanto, isso vai exigir um excelente controle do volume e da intensidade de exercícios, para não aumentar o risco de lesão ou de o atleta entrar em overtraining”, diz Boccalini.
É preciso respeitar a dor
Entres os sinais mais comuns do treinamento excessivo estão grande fadiga, alterações do sono, dor de cabeça constante, irritação e, principalmente, dor muscular frequente, muito além da provocada normalmente pelo treinamento.
“Um praticante de atividades nunca pode ignorar a dor e precisa aprender a diferenciar os alertas que o corpo dá. Quando falamos da dor de um excesso de treinamento, trata-se de um incômodo constante, que prejudica a força e geralmente não passa nem com o descanso, diferentemente da dor após um treino mais intenso ou de adaptação a um exercício novo”, afirma o profissional de educação física Italo Fernando, personal trainer na academia SmartFit.
Lee explica que, em uma condição saudável, a dor não deve durar por um tempo muito maior do que 72 horas. O ortopedista recomenda que, ao perceber um desconforto persistente é importante buscar orientação médica, pois pode ser sinal não só de excesso de treinamento, como também de uma lesão.
“Pense um pouco menos no ‘vencer a dor e superar limites’ e um pouco mais no treinar corretamente e respeitar seu corpo, para permanecer ativo e saudável até o final da vida”, aconselha.
Nossa matéria em parceria com o Viva Bem da Uol